SAÚDE MENTAL – Reportagem Revista Exclusive
Confira a reportagem com o Dr. Renato Araújo publicada na revista Exclusive na edição de FEVEREIRO 2021 – #93
Não perca a esperança
POR dr. Renato Araújo
Você já teve ou viu algum amigo ou parente com depressão?
Quem já passou por isso sabe que não é “frescura, falta de roupa para lavar ou de serviço”. Depressão é doença séria. Caracterizada pela manifestação de sintomas como tristeza persistente e perda do interesse pelas atividades cotidianas, a depressão já é considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) a primeira causa de incapacitação e invalidez. Estima-se que o transtorno psiquiátrico atinja 300 milhões de pessoas em todo o planeta, com grande prevalência tanto nas nações do primeiro mundo quanto nos países em desenvolvimento, acarretando grande sofrimento para os pacientes e prejuízos para os cofres da saúde pública. Além da alta incidência, a depressão se caracteriza pelo longo período de manifestação.
Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 5% das pessoas manifestam a depressão num período de 12 meses, e 15% sofrem com a doença ao longo de toda a vida. Além disso, mais de 50% dos pacientes que sofrem de depressão ficam com sintomas por períodos que variam entre 13 e 20 semanas. Pacientes com depressão também podem desenvolver transtornos associados, como crise de ansiedade e pânico, tentativa de suicídio ou uso de álcool ou outras drogas.
Estamos falando, então, de uma doença grave, impactante, cujo tratamento é baseado hoje em medicamentos e psicoterapia. Um grande estudo publicado em 2006, nos Estados Unidos, denominado STAR*D (Sequenced Treatment Alternatives to Relieve Depression – cuja a tradução pode ser Alternativas de Tratamento Sequencial para Aliviar a Depressão), tinha como objetivo avaliar a melhor estratégia para o tratamento da depressão, mas o que mais chamou a atenção na pesquisa foi que, independentemente do tipo de medicamento utilizado, da associação de medicamentos e psicoterapia, muitas pessoas com o distúrbio psiquiátrico não obtinham êxito com os tratamentos.
Conforme o estudo norte-americano, pelo menos um terço dos pacientes não respondia a mais de cinco tipos de intervenções medicamentosas; e a metade, ou seja, 50%, não apresentava melhora com dois tipos de medicações antidepressivas, o que é um número expressivo de pessoas com depressão. A esses pacientes, podemos chamar de pessoas com depressão refratária. Esse termo é amplo, sendo que o conceito mais aceito na atualidade considera como depressão refratária a ausência de resposta a, pelo menos, dois antidepressivos diferentes por tempo e dose adequados.
Fato é que, a partir de determinado momento — e esse ponto seria a refratariedade a dois medicamentos —, o paciente passa a ter uma chance muito menor de responder a uma terapia medicamentosa. E aí? O que fazer com esses pacientes? Eles têm outra possibilidade de tratamentos além de medicação e terapia? Sim. Nesse caso, o médico deve avaliar o motivo da refratariedade, se é realmente uma não resposta ou uma falta de aderência ao tratamento; se a dose do antidepressivo está adequada ou não; e se há presença de comorbidades, de outras doenças psiquiátricas ou clínicas que devem ser tratadas. A própria questão farmacogenética e o diagnóstico devem ser reavaliados também.
Passada essa etapa de avaliação do paciente com depressão refratária, o médico dispõe hoje de vasta gama de terapias que podem gerar resultados positivos no tratamento desse tipo de condição. Entre elas, destaca-se a eletroconvulsoterapia, procedimento bem constituído na literatura médica, moderno, seguro e eficaz. O outro recuso disponível é a estimulação magnética transcraniana — tratamento inovador que atua estimulando redes ou circuitos cerebrais envolvidos na depressão — e, mais recentemente, a cetamina, um anestésico que em doses determinadas têm efeitos antidepressivos robustos, atuando em receptores diferentes dos antidepressivos clássicos. Portanto, há um grande avanço para reduzir o número de pessoas acometidas pela doença capaz de tirar a alegria de viver. Sempre digo aos meus pacientes: “Ficar sem tratamento você não vai ficar. A gente vai buscar aquilo que for melhor para você e aquilo que você melhor responder, mas nunca podemos perder a esperança de que é possível tratar um paciente com depressão”.